Discussão sobre E-EEG

Introdução: O número de solicitações de E-EEG é relativamente baixo, consequentemente os custos são proibitivos ao usar um modelo 24/7, com técnica e médico neurofisiologista presentes. Mesmo o esquema de plantão à distância (equipe chamada quando necessário) pode ter custos elevados; por exemplo, técnicos de EEG nos EUA recebiam de US$ 1 – 4 dólares/hora ou cerca de 30% do salário-base para atender chamados de emergência.

Revimos 3 trabalhos que discutiram o E-EEG:

  1. Mark Quigg, Bassel Shneker & Paul Domer. Current practice in administration and clinical criteria of emergent EEG. J Clin Neurophysiol 2001; 18(2): 162-165.
  2. PN Varelas, MV Spanaki, L Hacein-Bey, T Hether & B Terranova. Emergent EEG. Indications and Diagnostic Yield. Neurology 2003; 61: 702-704.
  3. J Praline, B. de Toffol, K. Mondon, C. Hommet, C. Prunier, P. Corcia, B. Lucas, A. Autret.  EEG d’urgence: indications réelles et résultats. Neurophysiologie Clinique 2004; 34: 175-181.

Incidência do E-EEG: Quigg et al (questionários a 84 diretores médicos dos EUA e Canadá) notaram 80% dos serviços oferecendo E-EEG, mas 20% não o faziam por restrições orçamentárias e dificuldades com o suporte técnico. Varelas et al reviram 261 E-EEG feitos durante 52 meses em um hospital de Milwaukee, WI, EUA com incidência de 12.8%, mas consideraram E-EEG um exame para paciente internado realizado dentro de uma hora após a solicitação. Praline et al durante seis meses reviram 600 EEG de pacientes internados em Tours, França, definindo que E-EEG não pode esperar, por colocar em risco o prognóstico vital ou funcional. Todos afirmam que os exames são executados por técnicos de EEG. [Comentário: E-EEG devem ser realizados por técnicos de EEG com adequado nível de competência, por serem exames usualmente mais complexos].

Solicitação do E-EEG: Quigg et al referiram que a maioria dos laboratórios exigia consulta neurológica antes do E-EEG, porém 57% dispensavam serviços de neurologia e neurocirurgia (19% eximiam somente a neurologia); 11% exigiam de todos uma consulta formal prévia ao serviço de EEG. Para Varelas et al e Praline et al o E-EEG era solicitado pelo plantonista.

Aprovação da solicitação: em 7 locais feita pelo eletrencefalografista e em 10 locais por estagiários. [Comentário: para o E-EEG deve ser obrigatória a aprovação do médico eletrencefalografista, precedida de discussão clínica visando programação adequada].

Interpretação do E-EEG: o tempo decorrido entre a aprovação e a primeira interpretação foi de 3 ± 4 horas (faixa de 1 a 24 horas), tempo elevado se considerado o tratamento do Estado de Mal Epiléptico (EME) convulsivo. [Comentário: no EME convulsivo tônico-clônico generalizado o determinante do tratamento são as manifestações motoras evidentes e o EEG é feito depois para avaliar riscos de um EME não convulsivo].

Surpreendente foi a diferença de critérios entre a necessidade de aprovação do E-EEG pelo especialista e sua interpretação, com a maioria delegando aos técnicos de EEG e aos residentes de neurologia a imediata interpretação; a interpretação final, com revisão pelo especialista, era executada em média após 16 ± 11 horas. [Comentário: é aceitável delegar a interpretação técnica ao técnico em EEG; porém, a interpretação médica pelo especialista deve ser imediata, seguida por discussão clínica pertinente, auxiliando o diagnóstico e decisões].

Situações que não requerem E-EEG: pacientes em vigília com exame neurológico normal excluem a necessidade de estudo de emergência. [Comentário: acrescentar “esquecimento” de lançar um pedido ou um exame pedido para “aguardar” visita médica].

Recomendações da realização do E-EEG (consenso de Tours, 1996 – Praline et al): presunção clínica de morte encefálica quando se propõe retirada de órgãos para transplante; controle da eficácia do tratamento do EME Convulsivo; EME Não Convulsivo (EMEÑC); EME mioclônico; antes do tratamento, se existirem dúvidas sobre crises não epilépticas; instalação de neuro-sedação em paciente com traumatismo crânio-encefálico. Também são listadas situações clínicas não necessitando de E-EEG: crise epiléptica em paciente sabidamente epiléptico; crise epiléptica no contexto de intoxicação ou abstinência; TCE sem crise inaugurando o quadro; déficit neurológico estabelecido ou transitório; síndrome confusional de origem determinada; perda de consciência curta ou mal estares de causa incerta ou não neurológica; foi observado grande número de E-EEG para avaliar nível sedativo em pacientes em coma, o que não constituía uma urgência. A reunião de Tours estabeleceu recomendações para realização do EEG dentro das próximas 24 horas: semiologia clínica evocativa de EMEÑC; TCE com crises epilépticas inaugurais; crise epiléptica generalizada inaugurando o quadro; distúrbio sugerindo crise epiléptica focal; suspeita clínica de encefalite herpética.

Conceito importante é o do E-EEG contributivo, podendo influenciar a conduta clínica: registro de crise ou de EME focal ou generalizado; sinais de encefalopatia metabólica; registro de anormalidades paroxísticas focais ou generalizadas, permitindo fazer um diagnóstico sindrômico após uma primeira crise epiléptica; presença de desorganização focal após uma primeira crise epiléptica, orientando a avaliação etiológica. Na suspeita de EMEÑC o E-EEG era contributivo tanto ao mostrar uma atividade paroxística como ao se mostrar negativo, podendo afastar a hipótese de distúrbio de origem epiléptica.

[Comentário – nossa Proposta de Indicações]:

  1. Indicações claras: 1) EMEÑC: representa a melhor indicação do E-EEG, inclusive na avaliação de quadros agudos confusionais e de rebaixamento de consciência, com suspeita de EMEÑC; 2) avaliação de morte encefálica com doação de órgãos autorizada, após confirmação do diagnóstico por exame neurológico; 3) avaliação da resolução do EME convulsivo, especialmente sem melhora após o tratamento inicial.
  2. Possíveis indicações (após consulta ao neurofisiologista), para auxiliar em condutas: 1) avaliação de comas ou encefalopatias; 2) avaliação de crises a esclarecer ou de pseudocrises.
  3.  Existem condições geradoras de ansiedade, nas quais a realização do EEG pode ser postergada para os primeiros horários do dia seguinte ou para as próximas 24 horas, sem prejuízo da conduta clínica: 1) suspeita de meningoencefalite herpética ou de outras encefalites (usualmente, paciente já medicado); 2) suspeita de enxaqueca vértebro-basilar em crianças; 3) avaliação de pós-crise epiléptica, especialmente se o paciente mostrar melhora clínica; 4) diagnóstico diferencial entre crise epiléptica e manifestações sincopais, com perdas de consciência breves; o diagnóstico é essencialmente clínico; 5) quadros crônicos confusionais ou de rebaixamento do nível de consciência; 6) déficits neurológicos focais: o EEG usualmente confirma o diagnóstico, porém nem sempre traz novas contribuições.

As políticas do E-EEG em um hospital devem ser individualizadas, devido a diferenças na equipe, valores de pagamento, distâncias geográficas, etc. A disseminação de bases sólidas para aprovar ou negar um E-EEG permitirá reduzir situações potenciais de conflito.